O melhor modo de vivermos o
espírito da Quaresma será sempre a via trilhada a partir dos textos da
liturgia. Em cada Domingo, os textos da Palavra de Deus vão abrindo os caminhos
e propondo os novos passos da caminhada. No próximo Domingo, o primeiro desta
Quaresma, a Igreja propõe-nos um texto de Mateus. É a conhecida passagem das
tentações de Jesus. Trata-se dum texto muito rico do ponto de vista simbólico e
onde podemos descortinar aspectos novos apesar de já o termos lido e escutado
muitas vezes.
Jesus tinha acabado de ser
baptizado por João Baptista e o Espírito Santo conduziu-O para o deserto. João
pregava que o Reino de Deus estava próximo e que depois dele viria Aquele que
iria fazer esse Reino acontecer. Depois desta experiência com João, Jesus
retirou-se para deixar amadurecer no seu coração a voz de Deus. Aquela voz que
O apresentara como Filho quando subiu das águas e sobre Quem faria descer o
Espírito Santo. Jesus precisaria de aprofundar o significado daquele momento
que revelara a verdade da sua identidade e o sentido da sua missão. O deserto
foi sempre um território oportuno para escutar a voz de Deus.
No deserto, porém, foi tentado
por satanás. O maligno tentou Jesus por três vezes escolhendo bem a matéria de
cada tentação. Na primeira, o demónio provocou a debilidade física motivada
pelo alimento escasso e desafia Jesus a mudar as pedras em pão. Na segunda,
levou Jesus ao pináculo do templo que era a parte mais alta das muralhas de
Jerusalém e desafiou a sua confiança em Deus com a sugestão de se atirar dali
abaixo. Finalmente, o demónio levou Jesus a um monte muito alto e prometeu-lhe
todos os reinos da terra se se prostrasse diante dele e o adorasse.
Estas tentações com que o demónio
tentou Jesus são também indicadoras das tentações a que todos nós somos
sujeitos. O evangelho não revela só as tentações de Jesus, antes, também nos
põe de aviso em relação às nossas tentações: A tentação do pão fácil, da
ganância pelas riquezas nem sempre lícitas e sem olhar a meios; a tentação do
ter, dos consumos desenfreados e de dar aos bens materiais um lugar que, de
facto, não deveriam ter.
A segunda tentação mete em realce
a vontade de poder e de dominar os outros. É a tentação do orgulho e da vaidade
que pretende sempre fazer-nos julgar mais do que os outros. A ânsia de poder e
todo o género de prepotência que não olha a meios e está a um passo da
corrupção e da cultura da mentira. A única coisa que interessa é o proveito
individual e o bem próprio.
A terceira tentação é, de todas a
mais refinada: o demónio quer colocar-se no lugar de Deus. Este foi já o pecado
de Adão e Eva e continua a ser o pecado do homem do nosso tempo. O homem
pretende ser o “Senhor” da sua própria vida e colocar-se no lugar de Deus. A
cultura contemporânea proclamou a morte de Deus e o reinado do Homem superior,
único protagonista do seu destino.
Jesus resistiu às tentações e
voltou do deserto confirmado na sua missão. Enquanto esteve no deserto, João
Baptista fora preso e Jesus percebeu que chegara o tempo de iniciar a sua
missão pública.
A nossa sociedade cai com
demasiada facilidade nestas tentações do demónio. As consequências não escondem
o seu rosto. Quanto mais longe de Deus, mais prisioneiro do seu egoísmo vai
ficando o homem e mais longe vai ficando o ideal da fraternidade.
A quaresma é um tempo oportuno
para resistirmos à tentação e redescobrirmos a beleza de seguir o caminho de
Deus, adorando-O sobre todas as coisas. Será sempre a melhor via para construir
um mundo mais humano.
P. Mário
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