NATAL: O TEMPO DAS CANÇÕES

COMENTÁRIO|20161225




O próximo Domingo é dia de Natal. Durante quatro semanas, a liturgia convidou-nos a viver um tempo de súplicas: “-Vem, Senhor Jesus!”. O Advento é uma prece confiante que suscita a nossa vontade de esperança para além das nossas esperas humanas. O que suplicamos na caminhada de Advento é o céu desça à terra e tudo se renove com um novo espírito.

Com o nascimento do Menino Deus, as súplicas dão lugar às canções. Como anunciava a leitura do Cântico dos Cânticos já na novena do Natal: “Desabrocharam as flores sobre a terra; chegou o tempo das canções e já se ouve nos nossos campos a voz da rola. Na figueira começam a brotar os primeiros figos e a vinha em flor exala o seu perfume”.

Os ambientes que nos envolvem explodem de sentimentos fraternos e os corações são convocados para o convívio dos afectos. Algo de grande se anuncia por estes dias: Nasceu Jesus, cumpriram-se as profecias!

O nosso tempo é muitas vezes caracterizado como a era do descartável, do superficial onde somos chamados a vivenciar o quotidiano como uma espuma do tempo que se dilui sem deixar ecos na alma nem compromissos duráveis. No entanto, mesmo esmagados por uma cultura de superficialidade não abdicamos de celebrar um tempo assim, onde nos sentimos irmãos e onde nos detemos a escutar as doces melodias que anunciam o ideal dum mundo mais humano e mais fraterno.

O evangelho do próximo Domingo, faz memória da nossa origem: “No princípio era o Verbo”. O falar de Deus assinala o princípio das coisas e há-de permanecer no nosso coração um eco do divino que nos torna corresponsáveis na obra da Criação. Em cada ano, a Igreja coloca diante nós este anúncio para evocar a nossa memória mais recôndita: Somos de Deus! Vimos de Deus e para Ele peregrinamos. Corremos o risco da história, envolvemo-nos nas suas trevas, experimentamos os exílios do pecado, mas sabemos que somos chamados à Luz e que a palavra final é a primeira: A voz de Deus e o seu Verbo.

Outrora, muitos não receberam o mensageiro da Paz que veio inundar de Graça o coração da humanidade. Tal como outrora, também hoje muitos não O recebem, não escutam a Sua voz e tentam sufocar o tempo das canções. A esperança parece comprometida e os desejos de fraternidade estão cada vez mais esbatidos.

Celebrar o Natal, para os cristãos, é acolher esta Voz nova e tão antiga, o Verbo de Deus que se faz Menino para um novo convívio de amor que o nosso pecado comprometera. A Luz brilha de novo: Não deixemos que as trevas sejam mais fortes do que o seu brilho. Vivemos tempos de desafios complexos, mas também uma era de novas oportunidades para descobrirmos a nossa verdade essencial. No princípio era o Verbo. Hoje é importante que o falar de Deus nos congregue para que floresça o Evento da nossa salvação.

Celebrar o Natal é deixar que a Esperança aconteça com um encanto novo em quem caminha para Deus de mãos dadas com os irmãos, ao som das canções que o Deus Menino suscita num coro que inunda a terra com os sons da eternidade.

Um santo e feliz Natal.

P. Mário
  
 




DOMINGO IV TEMPO DO ADVENTO ANO A

COMENTÁRIO|20161218






O evangelho do próximo Domingo narra-nos o nascimento de nasceu segundo o relato de Mateus. Em tempo de Advento, esta leitura do evangelho antecipa-nos o mistério para nos aproximarmos de forma mais comprometida do Natal do Senhor.

Há leituras que já as ouvimos tantas vezes que quase as sabemos de cor. É o caso do evangelho do próximo Domingo. Quando assim é, corremos o risco de já não as escutarmos como se fosse a primeira vez, esvaziando o seu carácter inesperado de Boa Nova da salvação. É como se já soubéssemos como as coisas se passaram e mantemo-nos à distância do acontecido, como se o nascimento do Menino fosse uma história passada que conhecemos muito bem.

Este anúncio há-de ressoar nos nossos corações com o fulgor duma primeira vez. E como precisamos que isso aconteça! A profecia é sempre nova e o nascimento de Jesus não pertence ao rol das histórias conhecidas. Jesus hoje quer nascer de novo e isso ainda não foi vivido.

Perguntemos a uma mãe se já se contenta com os beijos e os carinhos do seu filho que recebeu no passado e se dispensa já o beijo de cada manhã que o seu filho lhe dá quando vai para a escola, ou o sorriso nos lábios quando regressa a casa e a vê de novo. Para uma mãe, cada momento com o seu filho, cada instante da sua vida é sempre algo novo porque o seu amor de mãe nunca se desgasta.

Em certa medida, é isto que deve acontecer em cada Natal. O Menino que a Virgem dá à luz é chamado Emanuel, isto é, Deus connosco. Estamos habituados a pensar em Deus olhando para o alto, imaginando-O para lá das nuvens. Ora o anúncio dos profetas que se concretiza em Maria, é desconcertante. Deus não é mais uma ideia inacessível ou um ser vago que imaginamos para lá das nuvens. O nosso Deus chama-se Emanuel, o nosso Deus é “Deus connosco”.

Certamente é aqui que somos mais tentados. No nosso íntimo habitam os horrores de Alepo, os recentes atentados da Turquia e do Egipto, o drama dos refugiados e um amontoado de perplexidades que geram o desencanto pelo mundo em que vivemos. Somos tentados a concluir que Deus já não habita entre nós, que se instalou o poder do mal e se anuncia a vitória da perdição. Nada de mais enganador.

Está em nós poder realizar a profecia do Emanuel. Um gesto teu, uma partilha e um olhar tornam Jesus presente na família, no trabalho na comunidade. Outrora o mundo estava em convulsão e bastou o coração duma jovem que disse Sim a Deus para que tudo mudasse. O Sim de Maria fez cair impérios, deu início a uma nova história.

O teu Sim pode fazer Jesus nascer. Cada um de nós deveria re-escrever neste Natal o texto de Mateus. Deveríamos poder dizer como nasceu Jesus na minha família, como nasceu Jesus na minha escola, no meu trabalho só porque eu escutei o anúncio dos profetas, disse Sim a Deus e deixei que o Espírito Santo me inundasse de luz.

Sim, Jesus quer nascer de novo, mas precisa dos nossos corações e da nossa vontade.


P. Mário


DOMINGO III TEMPO DO ADVENTO ANO A

COMENTÁRIO|20161211



O evangelho do próximo Domingo revela-nos um eloquente episódio que mete em confronto João Baptista e o próprio Jesus. O Nazareno tinha-se aproximado de João quando este pregava o Reino nas margens do Jordão. De tal modo se sentiu tocado pelo anúncio do Baptista que se apresentou para ser baptizado. Depois desta experiência Jesus retirou-se para o deserto onde foi tentado.

Terminado este tempo de prova, foi informado que João tinha sido preso e, impressionado por tal notícia, retirou-se para a Galileia, primeiro para Nazaré e depois para Cafarnaum. Começou, então, a pregar exortando à conversão e ao acolhimento do Reino que estava próximo. João já não presenciou pessoalmente o início da pregação de Jesus que se manifestava com uma mensagem vigorosa acompanhada de sinais que testemunhavam a sua identidade de Messias. É neste contexto que nos surge o evangelho do próximo Domingo. Os amigos de João faziam-lhe chegar à prisão as notícias do que se estava a passar com o filho de Maria e de José. Perante os relatos dos discípulos, João envia-os a Jesus a perguntar: “És Tu Aquele que há-de vir ou devemos esperar outro?” Jesus não responde de forma directa, antes, pede que vão contar a João os sinais que estavam a acontecer: curas de muitos doentes e o anúncio da Boa Nova aos pobres.

Importa reflectirmos um pouco sobre a resposta de Jesus. Não se refugia num discurso cheio de argumentos de modo a demonstrar que Ele era o Messias, antes, faz apelo aos sinais que acompanham a sua pregação. De igual modo, de nada nos serve dizer que somos cristãos, que temos muita fé e que somos muito cumpridores dos preceitos religiosos. A verdade da nossa fé manifesta-se pelo testemunho da nossa vida. São as nossas obras de caridade e partilha, de confiança e fidelidade que falam acerca da nossa fé. Quando alguém nos pergunta se temos fé, mais do que elencar as afirmações do credo que professamos, deveríamos poder contar os sinais que se manifestam na nossa vida. Amamos como Jesus nos amou? Estamos prontos a dar a vida uns pelos outros? Não fazemos aos outros o que não queremos que nos façam a nós? Então, temos verdadeiramente fé.

Quando os discípulos de João partiram e foram ter com ele ao cárcere, Jesus ficou a falar com os presentes acerca do testemunho de João Baptista. E perguntou: “Que fostes ver ao deserto? Uma cana agitada pelo vento?...” Jesus acabará por referir que João era o profeta enviado à frente como mensageiro da chegada do Reino de Deus. A sua vida estava marcada pela coerência entre as palavras e os sinais que testemunhava, por isso estava preso.


Neste tempo de Advento, será que a nossa vida já demonstra os sinais da vida do Messias? Não basta esperar que Ele venha: É necessário que ela testemunhe a caridade fraterna, a partilha, o acolhimento, a compaixão. São esse o cenário que Jesus prefere. O nosso testemunho como cristãos é o verdadeiro presépio onde Jesus quer nascer. Moldemos, pois, o nosso coração. Agora que nos mobilizamos para construir presépios nas nossas casas e nas igrejas, nas montras e nas praças, preocupemo-nos, antes de mais com os sinais na nossa vida que devem testemunhar a chegada da Luz e da ternura do nosso Deus. 

P. Mário