TEMPO COMUM DOMINGO III ANO C


O evangelho do próximo Domingo narra-nos o início da pregação de Jesus, na sinagoga de Nazaré. Segundo o texto de Lucas, depois do seu Baptismo, Jesus retirou-se para o deserto onde foi tentado. Após esta experiência, Jesus viu confirmada a sua missão de anunciar o Reino de Deus. Começou a percorrer a Galileia. Ensinava nas sinagogas e todos o elogiavam.

Foi neste contexto que Jesus foi a Nazaré, terra onde tinha crescido e onde todos o conheciam. Podemos imaginar o entusiasmo com que os nazarenos o terão acolhido. A sua fama, como refere Lucas, já se tinha propagado a toda a região e os seus conterrâneos deviam sentir grande orgulho nisso. Todos gostamos que na nossa terra haja gente famosa. Por isso, quando Jesus foi à sinagoga de Nazaré, em dia de Sábado, pediram-lhe que fosse o leitor naquele dia. Jesus leu uma passagem do profeta Isaías que anunciava a vinda do Messias.

Esta passagem messiânica descrevia os sinais que deveriam acompanhar a vinda do Messias: O anúncio da Boa Nova aos pobres, a redenção dos cativos, a vista aos cegos, a libertação aos oprimidos e a proclamação do ano da graça do Senhor. O Messias seria o Ungido de Deus para realizar estes sinais mediante os quais todos deveriam reconhecer que o Messias chegara. Os olhos de todos os presentes na sinagoga estavam fixos n’Ele e esperavam uma palavra sua.

Depois da leitura, Jesus enrolou o livro de Isaías e proclamou: “Cumpriu-se hoje mesmo esta passagem da Escritura.” Aquelas palavras, para Jesus, não eram letras passadas nem relativas a um futuro incerto. Para Jesus, a Palavra de Deus é actual e, por isso, a sua missão era um testemunho de que as profecias se estavam a cumprir n’Ele.

Podemos tirar alguns ensinamentos desta passagem para a nossa vida: Quando escutamos a Palavra de Deus nas leituras da Missa, podemos correr um risco muito comum: Imaginamos que aquelas palavras se referem a acontecimentos muito longínquos que narram coisas do passado que nos fascinam e nos deixam curiosos sobre o significado desses acontecimentos. Assim, o Natal pode ser lido como uma história passada, assim a Páscoa pode ser interpretada como um gesto heróico, mas acontecido há dois mil anos.

Se ouvirmos a Palavra de Deus como um acontecimento passado, estamos a criar distância entre nós que vivemos no presente e a Palavra que narra coisas passadas. A sabedoria é escutar a Palavra de Deus de modo a podermos dizer como Jesus: “Hoje cumpriu-se esta passagem da Escritura” na minha vida. A Palavra de Deus é actual, pretende iluminar as minhas vivências do presente e vem ao encontro da minha sede espiritual.

Escutar a Palavra sentindo que é dirigida a mim no momento em que a escuto e que vem ao meu encontro porque Deus não me deixa só, antes, se manifesta no meu caminho como Salvador, é a atitude a ter ao escutar as leituras da Missa. Quando as escutamos, deverá haver sempre, dentro de nós, uma inquietação sincera: O que me quererá Jesus dizer com estas palavras?


Se as ouvirmos com atenção, talvez possamos dizer, como Jesus: “Hoje cumpriu-se esta passagem da Escritura” na minha vida.

P. Mário

DOMINGO II TEMPO COMUM ANO C





No próximo Domingo, o evangelho de João narra-nos o primeiro milagre da vida pública de Jesus: as bodas de Caná. Jesus, Maria e alguns discípulos foram convidados para um casamento e, em plena boda, como viesse a faltar o vinho, Jesus transformou a água dos ritos da purificação em vinho que viria a ser muito apreciado pelos convivas.

São muitos os pontos de reflexão que podemos escolher deste texto de João como ensinamentos para a nossa vida. Desde logo, é muito interessante que Jesus tenha realizado o primeiro sinal da sua vida pública no contexto dum casamento e no ambiente duma festa. A presença de sua mãe e o papel que ela desempenha é, também significativo. A fé dos discípulos que se vê confirmada pelo gesto de Jesus é, igualmente, um ponto fundamental deste episódio.

A falta de vinho numa festa é, no mínimo, algo inesperado e desconfortável. Maria é a primeira a notar e, de imediato, provoca Jesus e faz desencadear a sua missão. A maternidade de Maria, segundo a natureza pela qual a Virgem de Nazaré gera e faz nascer o Menino, vê-se agora enriquecida pela via da sua fé: Maria faz nascer Jesus em ordem aos sinais da sua missão. É Ela que suscita o primeiro sinal do seu Filho enquanto Messias.

Também na nossa vida, muitas vezes, falta o vinho ou, mais concretamente, muitas qualidades de vinho: o vinho da amizade, da compreensão e do acolhimento; da aceitação, da serenidade e da coragem de recomeçar. É frequente que nas nossas famílias estes vinhos possam vir a faltar. Basta uma desatenção ou um momento menos cuidado para que tudo se questione e leve a situações difíceis de equacionar ou resolver.

Quando isto acontece, se Jesus está presente e é nosso convidado, tudo se ultrapassa porque Ele transforma a água da nossa debilidade no néctar do seu amor. Se Jesus não está, sobe de tom o egoísmo e a vontade de poder ou a razão implacável que tem a força de esmagar o outro para que eu imponha os meus critérios.

Os momentos difíceis, podem acontecer e fazem parte de todas as caminhadas sejam em família ou nos vários cenários da nossa existência. O segredo é que Jesus seja sempre nosso convidado e partilhe sempre a nossa mesa. A sua presença faz com que se ultrapassem os obstáculos e se renove o amor. O que poderia vir a ser um grande desentendimento, pode tornar-se numa ocasião para reforçar os laços da amizade e do amor se Jesus está com os sinais da sua presença.

Com Jesus, o vinho tem mais sabor e é muito apreciado pelos convivas. A alegria manifesta os seus dons e a sala inunda-se com a suavidade do seu olhar. Quantas vezes, os momentos maus que temos são só momentos de egoísmo que precisam de se encontrar com o Mestre da Galileia para que tudo se refaça e a alegria se reencontre.

Façamos da nossa vida uma convivência onde Jesus está e veremos acontecer os sinais radiosos do seu amor no meio de nós.

P. Mário



A URGÊNCIA DA ESPERANÇA



O começo do novo ano, parece não ter feito abrandar a onda de horrores que tem marcado a nossa história recente quer a nível nacional quer internacional. Sucedem-se as notícias uma mais brutal que a outra: Uma mãe que envenena um filho, um adolescente enterrado no jardim duma instituição, vítima de violência; continuam a morrer refugiados no Mediterrâneo, entre os quais muitas crianças. O bispo de Toledo denuncia que muitas mulheres são assassinadas por que pedem o divórcio e as vítimas dos crimes de abuso sexual não param de aumentar.

A nível económico e social também tudo parece estar a complicar-se com bancos a falir e diagnósticos para o novo ano muito reservados para alguns analistas e muito pessimistas para outros. Sucedem-se as denúncias de corrupção e os abismos entre pobres e ricos não param de aumentar.

No meio de todos estes cenários, o anúncio da esperança parece despropositado e anacrónico. Cada início de ano traz consigo a velha máxima: “Ano Novo, Vida Nova”, porém, esta profecia parece cada vez mais desgastada e votada ao descrédito. No entanto, o anúncio inicial da fé em Jesus Cristo é precisamente a Luz que começou a brilhar nas trevas.

O que de pior poderia acontecer na nossa convivência histórica seria o baixar dos braços face à nossa missão de sermos portadores da paz e da esperança. Hoje, o cristão tem que ser um dissidente não só em relação à corrupção ou ao consumismo, à violência ou ao hedonismo. Hoje, um dos campos em que o cristão tem que enfrentar com mais decisão é o pessimismo angustiado da nossa geração.

Não se trata de fechar os olhos à realidade e, muito menos, viver alienados em relação aos reais problemas que afligem a nossa sociedade. Pelo contrário, a fé em Jesus Cristo implica a encarnação nos desígnios da história. Todavia, a fé dos cristãos implica um compromisso com a esperança que deve ressoar como um imperativo.

Não basta dizer que tudo está mal e já nada tem solução. Urge ser protagonista da mudança e profeta da esperança no coração da história. Um dos males do nosso tempo, já o denunciava Teilhard de Chardin é a fuga à realidade em vez da coragem de abraçar os desafios da mudança.


Aos cristãos pede-se esta coragem e esta missão. A paixão em seguir a Cristo implica a paixão pelo homem e pela transformação da história.

P. Mário