Comentário
No primeiro Domingo da Quaresma, a liturgia propõe-nos um
texto do evangelho de Marcos que nos desafia para um renovado encontro com Deus.
Depois do seu baptismo, Jesus deixou-se conduzir pelo Espírito Santo ao deserto
e por lá permaneceu quarenta dias. Foi um tempo de comunhão íntima com o Pai e
no Espírito que confirmou a sua missão junto do seu povo.
Jesus era tentado pelo demónio e vivia entre feras e anjos.
O demónio tudo fez para desviar Jesus da sua missão mas a sua fidelidade ao Pai
que O enviara, conduziria o Messias esperado ao coração das dores e das
esperanças da humanidade. Foram dias de prova e de plenitude, de discernimento
e de abraço livre à vontade do Pai.
Jesus vivia no deserto entre feras e anjos. Será assim
durante todos os três anos de vida pública. Enfrentará os poderes instalados e
sentirá a consolação do Pai; será expulso de sinagogas e de localidades mas
contará com o calor dos discípulos e de quantos o seguiam. Jesus não fugirá aos
confrontos, à denúncia e à profecia. Não se deixará conduzir por protagonismos
tentadores nem se deixará acorrentar aos laços meramente humanos. Aos argutos
escribas e doutores da Lei, dará respostas cheias de sabedoria e aos discípulos
não esconderá as dificuldades de O seguir.
Pelo texto de Marcos, compreendemos que a morte de João
Baptista, seu primo, foi decisiva para Jesus iniciar a sua vida pública. Essa
morte deve ter marcado Jesus muito profundamente mas foi acolhida como um sinal
de que chegara o tempo oportuno para o anúncio do Reino. Herodes mandara
degolar um profeta mas a voz de Deus não se podia calar. É neste contexto que
Jesus inicia a sua missão.
Este texto de Marcos, enquanto narra o início da missão de
Jesus, propõe-nos um caminho para nós mesmos, segundo as pegadas do Mestre da
Galileia. Neste início de Quaresma, deixemo-nos conduzir pelo Espírito Santo ao
deserto. Lugar de silêncio e despojamento, o deserto convida-nos a olhar o
essencial. A nossa alma oxidada pelas propostas do mundo, necessita da
experiência do recolhimento e da interioridade onde a voz de Deus nos faz
reencontrar com o sentido da nossa existência.
No deserto da vida, também nós, tal como Jesus, convivemos
com feras e anjos. O mundo é habitado por toda a espécie de males mas também
não faltam extraordinários testemunhos do evangelho. Em vez de nos queixarmos
com as mazelas do mundo e com os que semeiam o mal, deixemo-nos, antes, tocar
pelos gestos dos que são sinais do amor de Deus e edificam a esperança. No
fundo, o nosso coração é o lugar onde convivem as feras e os anjos.
O texto de Marcos termina com um veemente convite à
conversão: «-Convertei-vos e acreditai no evangelho». Olhar a vida como um
itinerário de mudança e de conversão é próprio de quem quer fazer da sua
história uma oportunidade de encontro com Deus, amando os irmãos. Só a coragem
da mudança pela via do amor, faz acontecer em nós os sinais do Reino de Deus.
Não desperdicemos este tempo oportuno. Deus quer precisar de
nós para que o seu Reino aconteça no coração da nossa história pessoal e
colectiva.
Padre Mário Tavares de Oliveira
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